A bolha das sondagens e o eleitor “típico” do Chega. Artigo de Cecília Honório
Por pouco relevante que tenha sido a última votação na extrema direita, a bolha das sondagens e o alarido dos comentários justificam atenção. Homem, branco, menos escolarizado, eis o eleitor “típico” dos partidos congéneres do Chega. Não sendo tão simples como parece, aqui ficam algumas referências úteis.
Artigo de Cecília Honório
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"Eingemauerte Nazis" de Max Braun com licença CC BY-SA 2.0 |
Para Eric Fassin1, Trump conferiu existência e legitimidade política à versão sexista e racista da identidade masculina branca. Rejeitando o voto dos pobres em Trump, define-o como branco, masculino, menos diplomado, e evangélico. Jan-Werner Muller2 aceita que, a Ocidente, o perfil é masculino e menos escolarizado, mas alerta para o peso dos bem-sucedidos economicamente e o seu darwinismo social, ou para os casos da França e da Áustria, onde estes partidos comem de todos os outros e de todos os grupos sociais. Cas Mudde3 apresenta o eleitor “típico” - homem, branco, de educação moderada, mais novo e preocupado com a imigração - para reconhecer que a evolução destas formações, nas diferentes vagas que analisa, vai para além desta imagem. Os partidos de extrema-direita populista foram capazes de atrair com intensidade a pequena burguesia, os pequenos empresários; os que mais seduziram os trabalhadores traídos pela social-democracia, como a FN ou a FPO, também se reconfiguraram e, sobretudo na 4.ª vaga (a partir de 2000), as formações com maior sucesso foram a todos os sedimentos sociais, mantendo-se o “gap de género” uma singularidade, quer ao nível dos membros, quer, sobretudo, do eleitorado.
E por cá, o que sabemos sobre as intenções de voto no Chega? O que dizem os analistas?
Em fevereiro, o “retrato-robô” caía por terra. Pedro Magalhães, em trabalho solicitado pelo Expresso ao ISCTE/ICS4, rejeitava o “retrato-robô” do eleitor, considerando-o uma caricatura pouco útil. Cauteloso com a amostra (e poderia ter sido mais, considerando a ficha técnica) e partindo da sondagem que dava 6% ao Chega, desfazia o “eleitor-tipo”: metade dos que tencionavam votar eram mulheres; o partido não era para os mais novos (18-24 anos); o voto era urbano e o eleitorado mais politizado do que o da direita tradicional; 1/5 com curso superior, mais de 1 em cada 3 com ensino secundário, tudo acima da instrução média nacional, e em colisão com o “retrato-robô”.
Seis meses depois, o eleitor “típico” reaparece. Artigo do Público5, com base na sondagem da Católica para o Público/ RTP, de 23 de julho, dá conta que, afinal, os que têm intenção de votar no Chega são, sobretudo, homens, com o ensino secundário. Sustentando que a captação de voto não se faz à abstenção, mas aos outros partidos e, no caso do Chega, por transferência do PSD e do PS, os eleitores dos novos partidos (Chega da IL) seriam maioritariamente homens, colocando-se o Chega, nas faixas etárias entre os 25 e os 54 anos e com menor nível de escolaridade.
E por cá, o que sabemos sobre as intenções de voto no Chega? O que dizem os analistas?
Em fevereiro, o “retrato-robô” caía por terra. Pedro Magalhães, em trabalho solicitado pelo Expresso ao ISCTE/ICS4, rejeitava o “retrato-robô” do eleitor, considerando-o uma caricatura pouco útil. Cauteloso com a amostra (e poderia ter sido mais, considerando a ficha técnica) e partindo da sondagem que dava 6% ao Chega, desfazia o “eleitor-tipo”: metade dos que tencionavam votar eram mulheres; o partido não era para os mais novos (18-24 anos); o voto era urbano e o eleitorado mais politizado do que o da direita tradicional; 1/5 com curso superior, mais de 1 em cada 3 com ensino secundário, tudo acima da instrução média nacional, e em colisão com o “retrato-robô”.
Seis meses depois, o eleitor “típico” reaparece. Artigo do Público5, com base na sondagem da Católica para o Público/ RTP, de 23 de julho, dá conta que, afinal, os que têm intenção de votar no Chega são, sobretudo, homens, com o ensino secundário. Sustentando que a captação de voto não se faz à abstenção, mas aos outros partidos e, no caso do Chega, por transferência do PSD e do PS, os eleitores dos novos partidos (Chega da IL) seriam maioritariamente homens, colocando-se o Chega, nas faixas etárias entre os 25 e os 54 anos e com menor nível de escolaridade.
Na verdade, sabe-se tão pouco sobre o eleitor tipo quão mal se conhecem os processos de transferência de voto. É cedo para avaliar, e muita água correrá. O que se sabe é que, lá fora, estes partidos seduzem e recrutam menos as mulheres, considerando a sua lógica machista, a agenda antifeminista e anti-lgbti, o culto da família tradicional e o programa de destruição dos serviços públicos, pelo que estas são as agendas e as lutas que importam.
1 Populisme: le grand ressentiment, Textuel, 2017.
2 What is populism, University of Pennsylvania Press, 2016.
3 The Far Right Today, Potily, 2019.
4 Pedro Magalhães, “Quem quer votar no Chega”, Expresso, 15 de fevereiro de 2020.
5 Ricardo Reis e João António, “Chega e Iniciativa Liberal – partidos ascendentes no quadro político português”, Público, 6 de agosto de 2020.